Em vista de acabar com qualquer "heresia-branca" que diz ser indiferente o jeito como se faz as coisas, como se deve portar em determinada ocasião, ou agir, levando a sociedade cada vez mais para a barbárie selvagem tão distante do requinte e da nobreza de outrora, trazemos hoje um texto de São Tomás de Aquino editado.
Segunda Parte da Segunda Parte
Questão 168 - A modéstia enquanto se ocupa dos movimentos externos do corpo.
Artigo 1 - Existe alguma virtude nos movimentos do corpo ?
Objeções: Parece que não há virtude alguma nos movimentos do corpo:
1. Toda virtude faz referência ao ornato espiritual da alma, segundo se diz no salmo 46, 14: Toda a glória da filha do rei é interior, no que comenta a Glosa [1]: É dizer, na consciência. Mas os movimentos do corpo não são internos, e sim externos. Logo, não há virtude que se deles. (...)
Em contrário, está o fato do decoro da honestidade ser objeto de virtude. E a ordem dos movimentos externos pertencem ao decoro da honestidade, de acordo como Santo Ambrósio no I De Offic [4]: Não aprovo nas palavras ou gestos nada afetado, nem tampouco nada selvagem ou rústico. imitemos a natureza, que é exemplo de disciplina e modelo de honestidade.
Solução. É próprio da virtude moral o ordenar, mediante a razão, as coisas próprias ao homem. Agora, é claro que os movimentos externos do homem podem ser ordenados mediante a razão, porque os membros externos se movem sob o império da razão. Por isto, é claro que uma virtude moral se ocupa da ordenação destes movimentos.
Em relação a ordenação destes movimentos, pode-se considerar debaixo dos aspectos: segundo a conveniência da pessoa e segundo a conveniência em respeito às pessoas externas, negócios ou lugares. Por isto diz Santo Ambrósio no I De Offic [5]: Respeitar a beleza da vida é conceder a cada sexo e a cada pessoa o que lhe convém, o que pertence a primeira ordem. Enquanto ao segundo aspecto, acrescenta [6]: Este é o modo mais perfeito que devemos observar nos gestos, este é o ornato ajustado a todas as ações.
Por isto Andrônico [7] coloca duas virtudes sob a égide dos movimentos externos: o ornato, que tem em conta a conveniência da pessoa, e o que é, portanto, a ciência do dizer bem no movimento e nos costumes, e a boa ordem, que se ocupa de diversos assuntos e fatores concomitantes, e que são, por isto [8], espírito de discernimento, isto é, de distinção, das ações.
Respostas às objeções.
1. Os movimentos externos são para nós signos da disposição interna, segundo se diz no Eclo 19, 27: As vestes do homem, o riso dos dentes, seu modo de caminhar, nós falam de sua personalidade. E Santo Ambrósio diz, no I De Offic. [9], que o estado da mente se conhece na compostura do corpo e que o movimento do corpo é uma voz da alma.(...)
3. Como já observamos antes (reposta 1), os movimentos externos são signos da disposição interior, e se mira principalmente nas paixões da alma. Por isto a moderação dos movimentos externos requerem a moderação das paixões internas. E assim diz Santo Ambrósio, no I De Offic. [11]: que a partir disso (isto é, dos movimentos externos), julgamos que o homem escondido no profundo do coração é fútil ou jactancioso ou impuro, ou de outro modo, firme, puro e livre de manchas.
Também nos movimentos exteriores as pessoas se baseiam para emitir um juízo sobre nós, segundo Eclo. 19, 26: Pelo seu aspecto se descobre o homem, e por seu semblante o prudente. Por isso a moderação nos movimentos exteriores se ordena, de algum modo, aos outros, segundo o que diz Santo Agostinho na Regra [12]: Procurai que em vossos movimentos não ofendam a ninguém, senão que se comportem como convém aos santos.
Portanto, a moderação dos movimentos exteriores pode-se reduzir a duas virtudes, das quais o Filósofo fala no livro IV da Ética [13]. Com efeito, enquanto que nos ordenamos para outros por meio dos atos exteriores, a moderação dos movimentos exteriores passa a ser objeto da amizade ou afabilidade, que se ocupa dos gozos e das tristezas das palavras ou dos feitos em ordem aos outros com os que o homem convive. Mas enquanto que estes movimentos exteriores são signos da disposição interior, sua moderação pertence a virtude da verdade, pela qual nós mostramos, pelas palavras e pelas ações, como somos interiormente. (...)
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Fontes:
1. Glossa interl. (III 150r); Glossa LOMBARDI: ML 191,445. Cf. SANTO AGOSTINHO, Enarr. in Psalm., ps.44, super vers.14: ML 36,512.
2. ARISTÓTELES, lect.1 n.3 (BK 1103a23): S. TH., lect.1.
3. C.18: ML 16,49.
4. C.19: ML 16,53.
5. L.1 c.19: ML 16,53.
6. De Offic. Ministr. l.1 c.19: ML 16,53.
7. De Affect., De temperantia: DD 576.
8. De Affect., De temperantia: DD 576.
9. C.18: ML 16,48.
10. C.18: ML 16,49.
11. C.18: ML 16,48.
12. Epist.211: ML 33,961.
13. ARISTÓTELES, lect.6 a.3 (BK 1126b17); lect.7 n.1 (BK 1127a13): S. TH., lect.14.15.
14. C.18: ML 16,49.