S. Francisco de Sales, rogai por nós!
Extraído de: "O Príncipe dos Cruzados (Volume II, 2a edição)".
Fontes tiradas em maior parte de "Nobreza e Elites Tradicionais Análogas nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza Romana", Plinio Corrêa de Oliveira, 1993. Dispomos teses erradas sobre as formas de governo, e em seguida seguem os textos ilustrativos da Doutrina Católica contra tais teses.
->Teses errôneas sobre os sistemas de governo
- O Regime monárquico em si mesmo não é a melhor forma de governo, não é o que mais facilmente favorece a paz, é incompatível com a verdadeira democracia, e não há modo de rodeá-lo de aristocracia e democracia ou pelo menos esse não é o melhor modo para moderar ou robustecer este regime.
- A Igreja Católica não pode se compor com as diversas formas de governo, já que prefere este ou aquele sistema em qualquer circunstância, mesmo que o sistema não se oponha aos direitos divinos e humanos.
- Uma dada forma de governo não é preferível por se adaptar melhor ao caráter ou aos costumes do povo a que se destine e às circunstâncias de cada povo, mesmo que não se oponha aos direitos divinos e humanos.
->Textos ilustrativos da Tradição Católica
Sagrada Escritura
É verdade que o povo de Israel queria um rei para imitar outras nações, o que não agradou muito a Deus (I Sam VIII, 6-8 e I Sam VIII, 19-20), porém, Deus fez a vontade do povo (I Samuel VIII, 22), o que mostra que o regime não é ruim em si. Em seguida, o livro Sagrado dá até provas de que Deus estava com o Rei Saul: "Eis que o Senhor te ungiu por príncipe sobre a tua herança, e tu livrarás o seu povo das mãos dos seus inimigos, que o cercam. Este será para ti o sinal de que Deus te ungiu príncipe" (I Sam X, 1). Este rei prevaricou (I Sam XV, 10-11), mas não houve decreto divino para que a monarquia cessasse por causa disso, pelo contrário, Davi foi escolhido por Deus como rei (I Sam XVI, 1-13), e em sua posteridade foi profetizada a vinda do Messias (I Sam VII, 12-16).
Nosso Senhor Jesus Cristo era Rei, de sangue Real, da casa de Davi, e foi aclamado como tal (S. Mateus XXI, 9), além de ser Deus e, por isso, Rei de todo o universo.
Além disso, a estrutura da Igreja primitiva tinha um chefe dentre os apóstolos: São Pedro, conforme Nosso Senhor mesmo instituiu: "apascentai minhas ovelhas" (S. João XXI, 16), "tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela" (S. Mateus XVI, 18), e em outros versículos. Portanto, segundo a Sagrada Escritura, a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo tem uma estrutura monárquica, o que só prova a preferência por este modo de governar, já que Deus não podia escolher o pior modelo.
Papa Pio VI ao Consistório Secreto sobre a execução do
Pio VI |
"Após ter abolido a forma de governo monárquica, que é a melhor, ela [a Convenção] transferiu todo o poder público ao povo" [1]
Leão XIII
"Nem aqui se põe o problema das formas de governo: não há razão para que a Igreja não aprove o governo de um só ou de muitos, contanto que seja justo e atenda ao bem comum. Pelo que, salva a justiça, não se proíbe aos povos que adoptem o sistema de governo que mais adequadamente convenha ao seu gênio próprio ou às instituições e costumes dos seus maiores" [2]
"A soberania, de si, não está ligada a nenhuma forma de governo; ela pode assumir esta ou aquela forma, desde que procure realmente a utilidade e o bem comum (...). Se se quiser julgar retamente, nenhuma das várias formas de governo é de si repreensível, pois nada têm que repugne à doutrina católica, e podem mesmo, se postas em prática com sabedoria e justiça, conservar o Estado numa ordem perfeita" [3].
"Diversos governos políticos se sucederam em França no decurso deste século, e cada um com a sua forma distinta: impérios, monarquias, repúblicas. Encerrando-se nas abstracções, chegar-se-ia a definir qual é a melhor dessas formas, consideradas em si mesmas; pode-se afirmar igualmente, em toda a verdade, que cada uma delas é boa, desde que saiba rumar directamente ao seu fim, ou seja o bem comum, para o qual a autoridade social está constituída; convém acrescentar finalmente que, a partir de um ponto de vista relativo, tal ou tal outra forma de governo pode ser preferível, por se adaptar melhor ao carácter e aos costumes de tal ou tal Nação. Nesta ordem de ideias especulativas, os católicos, como qualquer cidadão, têm plena liberdade de preferir uma forma de governo à outra, precisamente em virtude de que nenhuma destas formas sociais se opõe, em si mesma, aos dados da sã razão, nem às máximas da doutrina cristã" [4].
S. Pio X
"O Sillon (...) semeia portanto entre a vossa juventude católica noções erradas e funestas sobre a autoridade, a liberdade e a obediência. As coisas não se passam diferentemente [com o Sillon] quanto à justiça e à igualdade. Ele trabalha, segundo afirma, para realizar uma era de igualdade que seria, por isso mesmo, uma era de melhor justiça. Assim, para o Sillon, qualquer desigualdade de condição é uma injustiça ou, pelo menos, uma justiça menor! Princípio soberanamente contrário à natureza das coisas, gerador de inveja e de injustiça, subversivo de toda a ordem social. Assim, só a democracia inaugurará o reino da perfeita justiça! Não é isto uma injúria às outras formas de governo que são rebaixadas, por este modo, à categoria de governos impotentes, apenas toleráveis? De resto o Sillon, ainda sobre este ponto, vai de encontro ao ensinamento de Leão XIII. Poderia ter lido na Encíclica já citada sobre o principado político que, `salvaguardada a justiça, aos povos não é interdito escolher o governo que melhor corresponda ao seu carácter ou às instituições e costumes que receberam dos antepassados', e a Encíclica faz alusão às três formas de governo bem conhecidas. Supõe, portanto, que a justiça é compatível com cada uma delas. E a Encíclica sobre a condição dos operários não afirma claramente a possibilidade de restaurar-se a justiça nas organizações actuais da sociedade, pois que indica os meios para isso? Ora, sem dúvida alguma, Leão XIII queria falar não de uma justiça qualquer, mas da justiça perfeita. Ensinando, pois, que a justiça é compatível com as três formas de governo em questão, ensinava que, sob este aspecto, a democracia não goza de um privilégio especial. Os `sillonistas', que pretendem o contrário, ou recusam ouvir a Igreja ou têm da justiça e da igualdade um conceito que não é católico" [5].
Pio XI
"A Igreja Católica, não estando de modo algum ligada a uma forma de governo mais do que a outra, ressalvados os direitos de Deus e da consciência cristã, não encontra dificuldades em compor-se com as diversas instituições políticas, sejam elas monárquicas ou republicanas, aristocráticas ou democráticas" [6].
Pio XII
"A democracia, entendida num sentido amplo, admite distintas formas e pode realizar-se tanto nas monarquias como nas repúblicas (...) O Estado democrático, seja monárquico ou republicano, deve, como qualquer forma de governo, estar investido do poder de mandar com uma autoridade verdadeira e efectiva" [7].
"A Igreja Católica (...) admite qualquer forma de governo desde que esta não esteja em oposição aos direitos divinos e humanos (...)" [8].
João XXIII
"Não pode estabelecer-se uma norma universal sobre qual seja a melhor forma de governo, nem sobre os sistemas mais adequados para o exercício das funções públicas, tanto na esfera legislativa como na administrativa e na judicial. Na realidade, para determinar qual há-de ser a estrutura política de um País ou o procedimento apto para o exercício das funções públicas é necessário ter muito em conta a situação actual e as circunstâncias de cada povo; situação e circunstâncias que mudam em função dos lugares e das épocas" [9].
João Paulo II
"A Igreja (...) não propõe sistemas ou programas econômicos e políticos, nem manifesta preferências por uns ou por outros, contanto que a dignidade do homem seja devidamente respeitada e promovida e a Ela própria seja deixado o espaço necessário para desempenhar o seu ministério no mundo" [10].
"A Igreja respeita a legítima autonomia da ordem democrática, mas não é sua atribuição manifestar preferência por uma ou outra solução institucional ou constitucional. O contributo por Ela oferecido nesta ordem é precisamente aquela visão da dignidade da pessoa, que se revela em toda a sua plenitude no mistério do Verbo encarnado" [11].
S. Francisco de Sales
"Deus, pois, querendo tornar boas e belas todas as suas coisas, reduziu a multidão e distinção delas a uma perfeita unidade; e, por assim dizer, as dispôs todas na monarquia, fazendo que todas as coisas interdependam umas das outras, e todas d'Ele que é o soberano Monarca. Reduz todos os membros a um corpo, sob uma cabeça; de várias pessoas, forma uma família; de várias famílias, uma cidade; de várias cidades, uma província; de várias províncias, um reino; e submete todo um reino a um só rei" [12].
São Tomás de Aquino citando a Sagrada Escritura
"Estabelecidas estas premissas, a saber, aos homens compete viver em sociedade, e para isto é indispensável que sejam retamente governados por algum chefe, cumpre indagar o que mais convém à província ou à cidade: se ser governada por muitos ou por um só. Isto, porém, pode-se considerar tendo em vista o próprio fim do governo.
Com efeito, todos os governantes devem ter como meta procurar o bem-estar daquele que tomou sob o seu governo, assim como compete ao piloto conduzir a nave ilesa ao porto de salvação, elidindo os perigos do mar.
Porém, sendo o bem e a salvação da sociedade a conservação da sua unidade – que se chama paz – perdida esta desaparece a utilidade da vida social. E isto tanto mais que a sociedade, na qual se introduziu a dissensão, é onerosa a si mesma.
Portanto, o que mais deve ter em vista o dirigente da sociedade é empenhar-se por obter a unidade da paz.
Nem cabe ao governante deliberar rectamente se deve ou não promover a paz na sociedade a ele sujeita, como o médico não se pergunta se há de curar ou não o doente a ele confiado. Pois a ninguém cabe deliberar a respeito do fim que lhe compete alcançar, e sim dos meios que conduzem a esse fim. Daí o dizer o Apóstolo, depois de recomendar a unidade do povo fiel: `Sede solícitos em conservar a unidade do espírito pelo vínculo da paz' (Ef. 4, 3).
Portanto, quanto mais um regime for eficiente para conservar a unidade da paz, tanto mais útil será. Pois dizemos ser mais útil aquilo que melhor conduz ao fim. Ora, é manifesto que mais pode produzir a unidade aquilo que de si é uno, do que o que é múltiplo, do mesmo modo que a causa mais eficaz do aquecimento é aquilo que de si é quente.
Portanto, é mais útil o governo de um que o de muitos. Além disso, é evidente que se muitos dissentirem totalmente entre si, de nenhum modo podem manter a sociedade. Requer-se, pois, em muitos, uma certa união, a fim de poderem, de algum modo, governar: porquanto muitos não podem conduzir uma nave para determinado ponto, a não ser que de algum modo se estabeleça uma conjunção entre eles. Porém, diz-se que muitos estão unidos na medida em que se aproximam da unidade. Portanto, melhor governa um só do que muitos, os quais, por proximidade, se tornam um.
Ainda mais: as coisas que são de acordo com a natureza funcionam melhor, pois em cada uma opera a natureza, que é o melhor. Ora, todo o governo natural procede de um só. Pois na multidão dos órgãos, um é o que move a todos, isto é, o coração; e nas partes da alma, uma faculdade principal preside às restantes, isto é, a razão. Também as abelhas têm um rei, e em todo o universo, um só Deus é o criador e governador de todas as coisas. E isto é razoável, pois toda a multidão deriva de um.
Porque se as coisas que procedem segundo a arte imitam as que procedem segundo a natureza, e a obra de arte é tanto melhor quanto mais se assemelha ao que é natural, é forçoso reconhecer que, na sociedade humana, o melhor é reger-se ela por um só.
Isto também a experiência o evidencia. Porque as províncias ou cidades que não são governadas por um só sofrem dissensões e flutuam sem paz, de modo que parece cumprir se o que o Senhor lamenta pela voz do Profeta, dizendo: `Numerosos pastores destruíram a minha vinha' (Jer. 12, 10). Pelo contrário, as províncias e cidades governadas por um rei gozam de paz, florescem na justiça, e se alegram com a abundância dos bens. Daí que o Senhor prometa pelos profetas ao seu povo, como grande mercê, pôr-lhe à frente um só chefe, e que haveria um só príncipe no meio deles [13].
Pe. Victorino Rodríguez, O.P. resumindo a obra de São Tomás de Aquino
"O regime misto, forma teoricamente ótima de governo. Nesta obra [De Regimine Principum], e concretamente neste capítulo sétimo, após analisar os três tipos de forma de governo (monarquia, aristocracia, democracia), S. Tomás inclina-se pela forma monárquica, se bem que tendo um poder moderado, para evitar um absolutismo tirânico: `Simul etiam sic eius temperetur potestas, ut in tyrannidem ne facili declinare non possit' [deve-se temperar o seu poder, de forma que não possa declinar facilmente para um governo tirânico].
Esta ideia de moderação do poder do monarca levou-o a plasmar, em obras posteriores, a teoria do regime misto como forma óptima de governo: o melhor modo de moderar e robustecer a monarquia é rodeá-la de aristocracia e de democracia. Limito-me a transcrever os dois textos que me parecem fundamentais e suficientemente claros a esse respeito: `Não é compreensível que das duas formas péssimas de governo (tirania e democracia* ou demagogia) possa sair uma forma de governo óptima. Procedem muito melhor os que fazem entrar diversas formas de governo correctas no governo da cidade, pois quanto mais for misto melhor será, tomando parte mais cidadãos no governo da cidade' [14].
* A respeito do termo democracia esclarece o mesmo padre dominicano: "Este sentido pejorativo da democracia nesta obra De Regimine Principum, é mantido nos comentários aos livros da Ética e da Política de Aristóteles, onde ela é chamada também governo `plebeu', governo `popular', governo `dos pobres', no qual a maioria numérica dos cidadãos se impõe sobre a minoria mais qualificada e, consequentemente, a oprime injustamente (daí o sentido pejorativo desta democracia). (...) Entretanto, na Suma Teológica, quando é feita alusão às formas de governo [15] somente a tirania aparece como forma incorrecta de governo e não a oligarquia nem a democracia, que podem ser mais ou menos correctas" [16].
Pe. Ireneu González citando autores escolásticos
"Quase todos os autores escolásticos, tanto antigos quanto modernos, juntamente com grande número de outros autores não escolásticos, afirma que a monarquia temperada é a forma preferível in abstracto" [17].
Plinio Corrêa de Oliveira
"Segundo a reta ordem das preferências, o católico empenhado em ser exímio na fidelidade à doutrina da Igreja, deve admirar e desejar mais o que é excelente do que o que é simplesmente bom. E ipso facto deve sentir-se especialmente grato à Providência quando as condições concretas do seu País comportam ou até clamam pela instauração da melhor forma de governo, que é, segundo S.Tomás, a monarquia" [18].
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[1] Alocução de Pio VI ao Consistório Secreto (17/6/1793) sobre a execução do Rei Luís XVI. Pii VI Pont. Max. Acta, Typis S. Congreg. de Propaganda Fide, Romae, 1871, vol. II, p. 17.
[2] Encíclica Diuturnum illud, 29 de Junho de 1881.
[3] Encíclica Immortale Dei, 1 de novembro de 1885.
[4] Encíclica Au milieu des sollicitudes, 16 de fevereiro de 1892.
[5] Carta Apostólica Notre charge apostolique, 25 de agosto de 1910.
[6] Encíclica Dilectissima nobis, 3 de junho de 1933.
[7] Da rádio-mensagem de Natal de 1944, Discorsi e Radiomessaggi di Sua Santità Pio XII, Tipografia Poliglotta Vaticana, vol. VI, pp. 238 e 240.
[8] Alocução no Consistório Secreto extraordinário, 14 de fevereiro de 1949, Discorsi e Radiomessaggi di Sua Santità Pio XII, Tipografia Poliglotta Vaticana, vol. X, p. 381.
[9] Encíclica Pacem in Terris, 11 de Abril de 1963.
[10] Encíclica Sollicitudo Rei Socialis, 30 de dezembro de 1987.
[11] Encíclica Centesimus Annus, 1 de Maio de 1991.
[12] Traité de l'Amour de Dieu in Oeuvres Complètes de Saint François de Sales, Librairie de Louis Vives éditeur, Paris, 1866, t. I, 3ª ed., p. 321.
[13] De Regimine Principum ad Regem Cypri, Livro I, cap. II, Marietti, Roma, 1950, pp. 259-260.
[14] In II Politicorum, lect. 7, nº 247.
[15] I-II, 95,4; II-II, 61,2.
[16] op. cit., pp. 31 e 33.
[17] Pe. IRINEU GONZÁLEZ
MORAL, S.J., Philosofiae Scholasticae Summa, BAC, Madrid, 1952, v. III, pp. 836-837.
[18] "Nobreza e Elites Tradicionais Análogas", Apêndice III, B-2.