A tourada e a caça avaliada pelos Papas, Prelados e a Lei Natural


S. Pio V, rogai por nós!

Extraído de: "O Príncipe dos Cruzados: manual do tradicionalista contra-revolucionário: Bíblia, Papas, Santos e Teólogos (Volume II, 2a edição)". 

Antes de textos da Tradição da Igreja Católica sobre este tema, propomos, desconhecendo texto mais autorizado e curto abordando tais questões hodiernas, um breve raciocínio para refutar prévias objeções surgidas no mundo neopagão atual, cujo pensamento tende a igualar o homem ao bicho.

Na Doutrina Católica é permitido matar animais, no entanto, não por sadismo na morte ou sofrimento do animal, mas por uma razão justa.

No caso da caça e da tourada o motivo para matar os animais é o divertimento ou eutrapelia advinda da participação humana nestas atividades (e não oriundo de um sadismo gozador do sofrimento do animal), as quais promovem a contemplação do belo, e subsistem em uma cosmovisão cristã.

Objeção 1: Se é possível matar animais pelo divertimento que uma atividade lúdica proporciona, poderíamos matar nosso cachorro ou um animal qualquer sem dono, por exemplo, como uma espécie de caça.

Resp: Só será possível dentro de um contexto. O animal tem como finalidade servir ao homem, mas cada animal o cumpre de diversas maneiras. O cavalo, por exemplo, cumpre seu fim, muitas vezes, como animal de carga.

Outros exemplos: certos animais, como os cachorros e gatos, fazem companhia e guardam o lar. Portanto, não podem ser mortos por divertimento em um jogo qualquer, mesmo se forem encontrados abandonados. Outros animais servem para alegrar o ambiente, como certas aves e certos primatas, que alegram por elementos como beleza e canto. Matá-los, mesmo para evitar invasão e furto de comida (como no caso dos primatas em certos locais), é injusto. Só não o seria se isto ocasionasse contexto perigoso para os homens, crianças e animais do lar (cujo instinto de proteção da casa pode levar a uma briga e ocasionar a morte de um).

As caças e os touros de tourada servem exatamente para a finalidade de, respectivamente, proporcionar a caça e a tourada para o homem.

Alguns ainda alegam que matar animais dentro de uma atividade lúdica é pecado, mas apoiam a caça. Se fossem coerentes, deveriam condenar a caça, porque algumas são liberadas mesmo não havendo diferença se ninguém fosse caçar, isto é, não são legalizadas por causa de uma necessidade de controle da reprodução daquele animal. Porém, alguma hora, se ninguém caçar, talvez isto se torne necessário.


Objeção 2: O touro e a caça existem unicamente para o alimento ou para auxiliar na reprodução dos animas que servem de alimento, ou seja, não devem passar por sofrimentos desnecessários para a obtenção daquela carne na sua melhor qualidade.

Resp: Na verdade, alguns touros e caças existem e são criados e protegidos exatamente para a finalidade das touradas e caças. De outro modo nem existiriam, ou seriam mortos por armadilha ou execução sem capacidade de luta, sem poder colocar seu instinto animal em cena, ou seja, sem poder alcançarem de modo mais pleno aquilo para que nasceram: lutar. De certo modo, estas práticas até promovem uma seleção natural, se se separarem os touros mais valentes e caças mais ágeis para se reproduzirem. Mais uma vantagem ao homem.

Por vezes a carne do touro e da caça servem de alimento, além de caça e tourada. Então, estes animais passam a ter dupla finalidade.

Objeção 3: A tourada e a caça não são divertimentos genuínos nem subsistem em uma cosmovisão cristã porque não se deve divertir-se, como católico, com os sofrimentos do animal, nem contemplar a arte quando ela passa um conceito moralmente reprovável.

Resp: Ninguém se diverte com os sofrimentos do animal. Isso seria sadismo. Ilícito, portanto. Se a diversão consistisse nos sofrimentos do animal, a tourada seria um mero show onde o touro é amarrado, sofre choques, pancadas e as torturas mais horríveis de frente ao público. O mesmo se diga da caça. 

No caso da obtenção de comida, ninguém acusa os açougueiros e empresas de carne de se divertirem com o sofrimento dos animais que por vezes é necessário para melhor obtenção da carne. Isto porque ali é evidente que nenhum deles procura aquilo, e sim a carne. Do mesmo modo, na tourada e na caça há uma busca pelas finalidades da atividade lúdica: a distensão, a habilidade, a contemplação, a vitória.

Ambas as atividades estão inseridas no contexto de um jogo, onde costuma haver vencedor e vencido. A diversão vem de ver vencidos a caça e o touro. Querer o infortúnio do toureiro é pecado e típico neopagão, pois neste caso se deseja a morte de um homem, muito superior aos animais.

O manejo das armas, a capacidade de cálculo, a agilidade, etc. são características comuns de ambas as atividades que desenvolvem a habilidade, o raciocínio e a percepção, apesar dos meios serem diferentes. Isto, alinhado ao jogo, faz destes um tipo de divertimento.

A cosmovisão cristã está inserida nas seguintes características:

Antimaterialista: Na vitória do espírito sobre a matéria, como um alpinista que vence uma montanha, é o toureiro que derrota o touro, representante da matéria.

Anti-igualitária: Coloca o touro em lugar de servidão e abaixo do homem, mostrando a hierarquia do universo, que é católica e monárquica.

Antidesarmamentista: Na caçada se louva a cultura das armas. Na tourada o armamentismo está implícito.

Valores de alma: heroísmo, valentia, inteligência, controle emocional.

Também a cosmovisão está inserida na contemplação do belo nestas atividades: o toureiro apresenta roupas esteticamente admiráveis, armas bonitas, e o touro, o seu vigor e beleza, assim como os cavalos, quando participam. Já na caça, a beleza vem do animal abatido, o modo como isto se realiza, o lugar, etc.

Em suma, a tourada e a caça refutam uma visão de mundo materialista, igualitária, vegana, individualista (anti-heróica), desarmamentista e vitimista.

-Os Papas da Santa Igreja e teólogos sobre a tourada

Foi proibida no começo, porém, liberada depois para o Reino das Espanhas. Ou seja, não é intrinsecamente má ou contra a Doutrina Católica como alegam os repudiadores de tal atividade lúdica. A razão pela qual foi proibida era o perigo para os homens, como fica evidente nos textos abaixo.

O Reino das Espanhas incluía Portugal e colônias, onde hoje ainda se vê touradas, embora os países tenham se tornado independentes. É importante notar que a legalização se aplicava para aqueles locais, indiferente da organização governamental de lá, as quais só foram citadas porque eram assim conhecidas na época.

São Pio V (1566-1572) proibiu as touradas

"Proibimos terminantemente por esta nossa Constituição, que estará vigente perpetuamente, de baixo de pena de excomunhão e de anátema em que se incorrerá pelo feito mesmo (ipso facto), que todos e cada um dos príncipes cristãos, qualquer que seja a dignidade de que estejam revestidos, seja eclesiástica ou civil, incluso imperial ou real ou de qualquer outra classe, qualquer que seja o nome com o qual os designe ou qualquer que seja sua comunidade ou estado, permitam a celebração destes espetáculos em que se correm touros e outras feras em suas províncias, cidades, territórios, praças fortes, e lugares onde se leve isto a cabo.

Proibimos, assim mesmo, que os soldados e quaisquer outras pessoas ousem enfrentar-se com touros ou outras feras nos citados espetáculos, seja a pé ou a cavalo.

E se algum deles morrer ali, que não lhe seja dado sepultura eclesiástica" [1].

Gregorio XIII (1572-1585) levantou esta proibição para os leigos

"§.2. Nós, aceitando as súplicas do Rei Felipe, humildemente apresentadas, por nossa autoridade Apostólica, e sobre a base desta, suprimimos e deixamos sem efeito as penas de excomunhão, anátema e interdito, assim como outras condenações e censuras contidas na Constituição de nosso predecessor Pio, nos citados Reinos das Espanhas, mas somente em relação ao leigos e aos irmãos militares, de qualquer Ordem militar, incluso aos que obtêm encomendas e benefícios dessas Ordens militares temporalmente; Contanto que os mencionados irmãos militares não tenham recebido alguma das Sagradas Ordens e que não se celebrem as touradas em dias de festas” [2].

Sixto V (1585-1590) reafirmou a autoridade da Bula de S. Pio V e sua revogação em parte por Gregório XIII em uma carta para um bispo

"O Papa Pío V mediante sua Constitução válida perpetuamente, proibiu os espetáculos taurinos e proibiu, também, tanto os leigos como os clérigos seculares e regulares de qualquer Ordem, que tomassem parte nos ditos espetáculos e jogos públicos, baixo de determinadas penas contidas na mencionada Constituição. Mais tarde, o Papa Gregório XIII de piedosa memória, assim mesmo predecessor nosso, declarou, por meio de Letras Apostólicas redatadas por ele, que a citada Constituição e as penas contidas nela eram aplicáveis aos clérigos tanto seculares como regulares, mas não aos leigos e aos militares, qualquer que fosse a Ordem militar a que pertencessem, sempre que não houvessem recebido alguma das Sagradas Ordens, tal como se estabelece (...) 

Concedemos a vossa Fraternidade em qualidade de Delegado nosso e da Sede Apostólica, livre faculdade e autoridade para, em virtude da autoridade Apostólica, advertir, ordenar e mandar tanto aos citados preceptores que não ensinem ou afirmem nada em contra da Constituição e Letras citadas, como a todos os clérigos compreendidos nas Letras de nosso predecessor Gregório, que não ousem nem se atrevam a tomar parte, de qualquer modo que seja, nas corridas e espetáculos mencionados" [3]

Clemente VIII (1592-1605) fez o mesmo

"Havendo chegado ao conhecimento de nosso predecessor Pío V, de feliz memória, que destes combates e espetáculos surgiam frequentemente perigos não só para o corpo, senão também para a alma, preocupado com a saúde da grei do Senhor, para fazer frente a estes perigos na medida de saus possibilidades con a ajuda de Deus, havia proibido mediante sua Constituição perpétua, a todos e cada um dos Príncipes Cristãos e a outras pessoas mencionadas na dita Constituição, de baixo de pena de excomunhão e anátema nas que se incorria ipso facto os que permitiam a celebração desta classe de espetáculos nos quais se correm touros e outras feras (...).

Mais tarde, nosso predecessor Gregório XIII, de piedosa memória, aceitando aos rogos de nosso filho muito amado em Cristo, Felipe, Rei Católico das Espanhas, o qual havia elevado súplicas movido pelo proveito que reportavam a seus Reinos as touradas, derrogou (o Papa Gregório) e deixou sem efeito as penas de excomunhão, anátema e outras condenações e censuras contidas na Constituição de nosso predecessor Pio, e os reinos das espanhas, mas em relação aos leigos e aos irmãos militares de qualquer Ordem militar, e aos que haviam obtido temporalmente encomendas e benefícios das mesmas Ordens militares, com o que os mencionados irmãos militares não tivessem recebido alguma das Sagradas Ordens nem se celebrassem as touradas em dias de festa e de que aqueles a quem deveria, tomassem medidas para evitar, no possível, que se seguisse do espetáculo a morte de alguma pessoa" [4].

Unanimidade dos teólogos diz que a tourada não é contra a lei natural

Segundo a Catholic Encyclopedia: "Moralistas em regra são da opinião que a tourada como praticada na Espanha não é proibida pela lei natural, visto que a habilidade e destreza dos atletas impede o perigo imediato de morte ou de lesão grave" (cf. P.V, Casus conscientiae, Vromant, Brussels, 1895, 3d ed., I, 353, 354; Gury-Ferreres, Comp. Th. mor., Barcelona, 1906, I, n. 45) [5]

-Os Papas da Santa Igreja sobre a caça

IV Concílio de Latrão (1215)

"Nós interditamos a caça e falcoaria para todos os clérigos" (Can. xv). Ou seja, não foi proibida para todos, mas só para os clérigos.

Concílio de Trento

"Que os clérigos se abstenham de caça ilícita e falcoaria" (Sess. XXIV, De reform., c. xii). Ou seja, há uma caça lícita.

Pio XII (1939-1958) louva o Conselho Internacional de Caça 

"Vous préservez en réalité de précieux éléments du patrimoine de l'humanité (vós preservastes em realidade preciosos elementos do patrimônio da humanidade)" [6].

Bento XIV (1740-1758)

Segundo a Catholic Encyclopedia, "é certo que um Bispo pode proibir absolutamente toda a caça aos clérigos de sua diocese. Isto foi feito por sínodos em Milão, Avignon, Liège, Colônia, e outros lugares. Bento XIV (De synodo diœces., l. II, c. x) declara que tais decretos sinodais não são muito severos, sendo uma absoluta proibição da caça mais própria para a lei eclesiástica. Na prática, portanto, o status sinodal das várias localidades precisa ser consultada para descobrir se é permitido caça silenciosa ou se toda caça é proibida" [7]

-Aos clérigos é permitido participar em touradas ou na caça?

Pelos textos acima mostramos como não lhes é permitido assistir ou tomar parte em touradas.

Abaixo vemos como para eles não é permitido igualmente caçar ou empunhar qualquer arma, exceto em caso de perigo. Também não lhes é permitido assistir a estas atividades, visto que não se coadunam com o estado clerical.

IV Concílio de Latrão (1215), Const.16

"Os clérigos não podem exercer cargos seculares nem administrar assuntos temporais, sobretudo se são desonestos; não devem assistir a sessões de pantomimas, trovadores ou atores; que se abstenham de visitar tabernas e hotelarias salvo necessidade em caso de viagens; que não joguem dados ou jogos de azar, e que não sejam tampouco espectadores destes jogos" [8]

Código de Direito de Canônico de 1917 diz que os padres só podem levar armas em caso de temor

"Evitem os clérigos tudo quanto não convenha à dignidade do seu estado de vida: não exerçam artes indecorosas, nem se entreguem a jogos de azar envolvendo dinheiro; não levem consigo armas, a não ser que haja uma justa causa de temor; não se devotem à caça, no caso das barulhentas; não entrem em tabernas ou lugares semelhantes sem necessidade ou justa causa, segundo o parecer do Ordinário do local" (Codex Iuris Canonici 1917. Can. 138)

S. Tomás de Aquino ensina que aos clérigos não é lícito matar 

"Aos clérigos não é lícito matar, por dupla razão. Primeiro, porque são escolhidos para o serviço do altar, no qual se representa a paixão de Cristo imolado, 'que ao ser espancado, não espancava' (I Pd II, 23). Portanto, não compete aos clérigos espancar e matar. Pois os servos hão de imitar o seu senhor, como se diz em Eclo X, 2: 'Qual é o juiz do povo, tais serão os seus ministros'.

A outra razão é que aos clérigos se confia o ministério da Nova Lei, que não comporta pena de morte ou mutilação corporal. Assim, para serem 'ministros autênticos da Nova Aliança', devem abster-se de tais práticas" [9].

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[1] "De Salutis Gregis Dominici", 1 de Novembro de 1567, Bullarum Diplomatum et Privilegiorum Sanctorum Romanorum Pontificum Taurinensis editio», tomo VII, Augustae Taurinorum 1862, páginas 630-631
[2] 25 de agosto de 1575, Encíclica Exponi nobis”
[3] Papa Sixto V: Breve  “Nuper Siquidem”(1586). Traduzida do texto latino: Ioannis Marianae e Societate Iesu. Tractatus VII. Pp. 182 183.
[4] Bula “Suscepti Muneris”, 1596
[5] Amadó, R.R. (1908). The Spanish Bull-Fight. In The Catholic Encyclopedia. New York: Robert Appleton Company. Retrieved June 4, 2015 from New Advent: http://www.newadvent.org/cathen/03051a.htm
[6] Papa Pio XII, Discurso aos participantes do Conselho Internacional de Caça, 12 de dezembro de 1957. Disponível em: http://w2.vatican.va/content/pius-xii/fr/speeches/1957/documents/hf_p-xii_spe_19571212_consiglio-caccia.html
[7] Fanning, W. (1910). Canons on Hunting. The Catholic Encyclopedia. New York: Robert Appleton Company.http://www.newadvent.org/cathen/07563c.htm
[8] Beatriz BADORREY MARTÍN, “Los sínodos diocesanos medievales y las fiestas de toros”, em IV Jornadas de Historia na Abadía de Alcalá la Real,  págs. 15-42, Jaén, 2003; ref. nas págs. 20-22
[9] Suma Teológica, II-II, q. 64, a. 4