Níveis de piedade segundo Dom Jean-Baptiste Chautard

Dom Chautard
Abaixo colocamos a classificação dos níveis de piedade, segundo o livro "A Alma de Todo Apostolado", de Dom Jean-Baptiste Chautard, OCSO, pgs. 159-161. Esta classificação é de grande utilidade para cada um saber em que nível de piedade está. Ao final, colocamos uma tentativa de dirimir uma dúvida que surge a partir desta reflexão, uma vez que sabemos da máxima do livro deste grande trapista que um dia será santo, se Deus quiser:

As obras são a irradiação da vida interior

1. Empedernimento 


Pecado mortal - Estagnação neste pecado por ignorância ou com a consciência maldosamente falseada. - Abafamento ou ausência de remorsos.
Oração. - Supressão determinada de todo recurso a Deus.

2. Verniz cristão

 
Pecado mortal - Considerado como mal de pouca conta e facilmente perdoado; a alma o comete sem resistência em qualquer ocasião ou tentação. - Confissão quase sem contrição.
Oração. - Maquinal, sem atenção ou quase sempre citada por algum interesse temporal. Concentrações raras e superficiais.

3. Piedade medíocre

Pecado mortal - Fracamente combatido. - Fuga pouco frequente das ocasiões, mas arrependimento sério e confissões sinceras.
Pecado venial - Pacto com este pecado, considerado como mal insignificante; logo, tibieza de vontade. Nada para preveni-lo, arrancá-lo ou descobri-lo.
Oração. - Regularmente bem feita de vez em quando. Veleidades passageiras de fervor.

4. Piedade intermitente

Pecado mortal - Lealmente combatido. Fuga habitual das ocasiões. Arrependimento muito vivo. Penitências para reparar.
Pecado venial - As vezes deliberado. Combate fraco. Pesar superficial. Exame particular sem objeto preciso, sem espírito de continuidade.
Oração - Resolução insuficiente de fidelidade à meditação que se abandona logo que cheguem as securas ou múltiplas ocupações.

5. Piedade perseverante

Pecado mortal - Nunca. Quando muito, raríssimas surpresas violentas e repentinas. Muitas vezes, então, pecado mortal duvidoso acompanhado de ardente compunção e penitência.
Pecado venial - Vigilância para evitá-lo e combatê-lo. Raras vezes deliberado. Vivamente sentido, mas pouco reparado. Exame particular continuado, visando apenas a fuga dos pecados veniais.
Imperfeições - A alma evita descobri-las para não as combater, ou as desculpa com facilidade. Renúncia admirada, desejada até, mas pouco praticada.
Oração - Apesar de tudo, fidelidade constante à meditação, muitas vezes afetiva. - Alternativas de consolações espirituais e de securas suportadas com muita mágoa.

6. Fervor

Pecado venial - Nunca deliberado - As vezes de surpresa ou sem advertência - Vivamente sentido e seriamente reparado. 

Imperfeições - Reprovadas, vigiadas e combatidas com energia para agradar a Deus. Às vezes, entretanto, aceitas, mas logo renegadas - Frequentes atos de renúncias - Exame particular visando o aperfeiçoamento de uma virtude.
Oração - Oração mental gostosamente prolongada - Meditação antes afetiva e até de simplicidade - Alternativa de vivas consolações e de provações cruciantes.

7. Perfeição relativa

Imperfeições - Prevenidas com toda a energia e muito amor - Sobrevêm apenas com semi advertência.
Oração - Vida habitual de oração, com ocupações exteriores - Sede de renúncia, de aniquilamento, de desapego, de amor divino - Fome da Eucaristia e desejo ardente do céu - Graças de oração infusa de vários graus - Muitas vezes, purificações passivas.

8. Heroicidade

Imperfeições. - De primeiro movimento.
Oração - Dons sobrenaturais de contemplação, às vezes acompanhados de fenômenos extraordinários. Purificações passivas acentuadas. - Desprezo de si levado até o esquecimento - Preferência dada aos padecimentos sobre as alegrias.

9. Santidade consumada

 
Imperfeições - Apenas aparentes.
Oração - As mais das vezes, união transformante. Conúbio espiritual - Purificações de amor - Sede ardente de sofrimentos e de humilhações.




-- Comentários a uma dúvida que surge --

Sabendo da máxima do livro, as obras são a irradiação da vida interior, para entender casos de apostolado, dividimos por tipos a seguir, aplicando também o versículo evangélico "pelos frutos conhecerei". Lembramos que apostolado, em nosso entender, quer dizer qualquer obra ou movimento, pois o católico de verdade não quer fazer as coisas senão catolicamente. E que, católico plenamente, quer dizer tradicionalista, assim como outrora quis dizer ultra-montano.

Virtudes teologais e seus análogos

Fé - Caridade - Esperança

Inteligência - Vontade - Memória

Doutrina - Vida interior - Obras


Não tradicionalista - Muita vida interior - Arregimenta muita gente

Como a fonte do apostolado não é Tradicionalista, este tipo de apostolado só na aparência é eficaz. A qualidade da vida interior da fonte é comprometida, pois muita vida interior é meramente o que se pode observar quantitativamente.

A vida interior ganha em qualidade pela fé, o que é claro no caso bíblico de Santo Elias contra os profetas de Baal no Monte Carmelo, os quais se feriam até sair sangue, gritavam e entravam em seus transes. Entretanto, não eram ouvidos ao pedirem que seu holocausto fosse consumado pelo fogo, pois não possuíam, para começo de conversa, a fé verdadeira. Já o holocausto de S. Elias foi consumido pelo fogo do céu. Algo semelhante se dá atualmente, com protestantes e pseudo-místicos variados. Um exemplo bem simples de que a vida interior ganha em qualidade pela fé é a devoção mariana: sabemos, pela fé na grandeza de Maria Santíssima, que a devoção mariana é a mais eficaz para a piedade.

Como Dom Chautard argumenta que ninguém pode dar o que não tem, e que, no apostolado, há sempre um grau a menos nos que são engendrados, este tipo de apostolado costuma engendrar pessoas com variadas formações doutrinárias e piedades, nunca Tradicionalistas. Normalmente, os engendrados costumam repetir os erros da fonte de apostolado, seja em tendências ou, como é mais claro, nas idéias.

Não tradicionalista - Pouca vida interior - Arregimenta muita gente

Igual ao caso anterior no que diz respeito à Fé e Vida interior, sendo a única diferença a pouca vida interior, ou seja, a vontade de amar a Deus existe em um grau bem pequeno. Vale lembrar que tudo sobre este caso e o anterior, aplica-se também aos pseudo-tradicionalistas.

Sobre as obras, podemos dizer que se dá algo incomum no caso anterior, pois este apostolado costuma engendrar gente moralmente muito ruim, pois possuem menos vida interior ainda, mesmo que considerando-a por quantidade. Eles praticam menos o amor a Deus e estão por isto mais propensos à imoralidade; estão desarmados espiritualmente contra as paixões.

Tradicionalista - Muita vida interior - Arregimenta pouca gente

Este caso, a princípio, pareceria uma contradição. Como um apostolado Tradicionalista e de muita vida interior pode arregimentar pouca gente? A resposta é que há algum problema na virtude teologal da Fé, algum problema doutrinário ou idéia errada. Só desta maneira se entende a ineficácia do apostolado.

De outra forma, entende-se quando a vida interior é falsa, ou seja, a pessoa finge rezar, faz outras coisas, só faz para ser vista, tal como Nosso Senhor disse no Evangelho, citando o caso dos fariseus. Contudo, esta alternativa é mais difícil de ser percebida. Normalmente, quando existe, acaba contaminando a noção doutrinária da pessoa também.

"Pelos frutos, conhecerei" disse Nosso Senhor. E pelas obras, em casos como este, é por onde se percebe o problema.

Tradicionalista - Muita vida interior - Arregimenta muita gente

Quando não é possível perceber uma questão doutrinária, como no caso anterior, das duas uma: este seria o verdadeiro apostolado ou há um problema nas tendências. É preciso ter em mente a revolução nas tendências, pois das tendências se passa às idéias, e destas aos fatos. Esta percepção possibilita entender a durabilidade e caminho no qual segue este apostolado.

Como no caso anterior, há a possibilidade da vida interior ser o foco da revolução nas tendências, usualmente partindo de um superior hierárquico, mas isto é difícil saber, ainda mais que o apostolado é eficaz em quantidade. Assim, ainda que seja por um exemplo meramente visual, por não haver vida interior verdadeira, outros do apostolado costumam manter uma vida interior meritória em certo grau, embora sejam afetadas em suas piedades por esta falta, pois há uma conexão espiritual dentro do apostolado.

Dado a máxima "pelos frutos, conhecerei" pareceria que as obras falam da vida interior e da fé do apostolado, entretanto é preciso saber o campo de ação deste apostolado para poder julgar se realmente há obras. Uma diocese, por exemplo, exerce jurisdição sobre todo seu território, de modo que não adianta notar que no bairro x ou y o fervor ou o número de católicos aumentou, pois o território inteiro deve ser considerado. Aquele bairro ou região está sob a jurisdição do pároco e padres locais também e, além disso, pode sofrer influência de apostolados locais, conventos, etc. Estes, muitas vezes desconhecem os problemas de outros apostolados locais ou mesmo de apóstolos de seu apostolado, por ignorância. Desse raciocínio vem a afirmação de que não há responsabilidade única sobre a qualidade católica de determinada população, embora o intuito aqui seja mostrar que a análise depende do objetivo de abrangência do apostolado.

Conclusão e comentário

Alguém poderia dizer que é melhor considerar o apostolado como "eficaz" ou não, pois nem todo apostolado visa arregimentar gente, como é o caso deste site. Isto é verdade para casos de tarefas específicas, mas também devemos lembrar que tarefas são feitas por pessoas, e que verdadeiro apostolado é o de exemplo, alma a alma, e não de escritos. A letra é morta, o espírito vivifica.

Agora, é preciso lembrar o que o Apóstolo São Paulo disse sobre a Caridade ser a maior das virtudes. Ora, caridade significa analogamente a vida interior, a vontade toda dada a Deus. O Santo Apóstolo diz tudo passará, no entanto, a caridade se mantém.

Assim, podemos ver que a Virgem Santíssima, que possuía a Caridade no grau mais elevado que já se viu e se verá na face da Terra, tinha toda a Fé pura e perfeita, por ser a Fé, em um primeiro movimento, um ato da vontade humana, e a dEla era dada toda a Deus. Possuía também a Esperança neste mesmo patamar, pois sua vida inteira era uma continuidade de sacrifícios visando as promessas de Deus, e tudo que fazia era imbuído deste espírito. Assim, isto se manifestava nas obras, como por exemplo o tempo em que ficou no templo; as roupas que costurava eram as mais bem feitas e belas possíveis, para mostrar a dignidade do Sumo Sacerdote daquele tempo, e por isso a durabilidade destas. Durabilidade que, segundo uma visionária, foi destruída quando o Sumo Sacerdote rasgou as vestes no interrogatório de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Por fim, vale recordar um dito de um Santo: "Quem quer ser útil às almas procure ter em si mesmo aquilo que há de ensinar aos demais." (S. Vicente Ferrer, Tratado da Vida Espiritual, Prólogo) 
 

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