"Fim dos tempos" é igual à "últimos tempos"? Autores (um elogiado por S. Teresinha e outro de extensa obra de profecias privadas) concordam que falta o mundo ser católico
S. Teresinha, rogai por nós!
Anterior deste capítulo: É possível determinar uma data limite mínima para o fim do mundo?
Veja também: Dois teólogos (incluso um admirado por S. Teresinha) convergem exegeticamente com o Pe. Vieira sobre um triunfo futuro
Extraído de: "O Príncipe dos Cruzados (Vol. I, parte 1, 3a edição, Cap. I)".
Muitos católicos, desesperançosos por causa do atual mundo imerso em pecado e tendo consciência de que a apostasia é um dos sinais que precede o Anticristo, pensam erroneamente que estamos no Fim dos Tempos que precederá imediatamente o Juízo Final. Cumpre, portanto, expor como a obra de alguns autores, que se debruçaram longamente sobre escatologia, se harmonizam em linhas gerais com a afirmação de que haverá um tempo triunfal e precedente para a Santa Igreja antes do Anticristo.
É ainda mais notável saber disso quando se nota que todos eram de tempos diferentes, e muito provável visões diferentes da situação da Igreja católica do mundo.
Um é o americano Desmond Birch, autor de um livro extenso (712 páginas) de 1997 que analisa profecias antigas e modernas, "Trial, Tribulation & Triumph: before, during and after Antichrist" [N.E: Julgamento, Tribulação e Triunfo: antes, durante e depois do Anticrost", sem tradução brasileira]. Outro é o sacerdote espanhol Benjamín Martín Sanchez, nascido em 1905, reitor do Seminário de Zamora, promotor da devoção a Nossa Senhora e da recitação do Rosário [1].
O terceiro é Charles-Marie-Antoine Arminjon (1824-1885), sacerdote francês. Inicialmente jesuíta, saiu com a aprovação da Ordem, e se tornou professor no seminário maior de Chambéry. Recebeu do Beato Papa Pio IX o título de missionário apostólico. Logo depois abandonou seu posto em Chambéry para se dedicar exclusivamente a pregações, entre as quais muitas ficaram famosas em coletâneas.
S. Teresinha professava uma especial admiração pela coleção editada em 1881 no livro “Fim do mundo presente e mistérios da vida futura”:
"Aos quatorze anos, com meu desejo de ciência, o bom Deus encontrou necessário juntar à "mais pura farinha, mel e azeite em abundância". Este mel e azeite, ele fez me provar nas conferências do Abbé Arminjon sobre o fim do mundo presente e os mistérios da vida futura. Ler esta obra mergulhou minha alma em uma felicidade que não é da terra. Eu já senti o que Deus tem reservado para aqueles que o amam (...).
Esse livro havia sido emprestado ao papai pelas minhas queridas carmelitas. Pedi para lê-lo, embora fosse algo muito contrário ao meu hábito (porque não lia os livros do papai). Essa leitura foi uma das maiores graças da minha vida, e a fiz na janela da minha sala de estudos” (30 de maio de 1887) [2].
Após a descoberta do segredo original de La Salette no arquivo do Vaticano, Birch, que mais se aproximou deste trabalho, precisa ser atualizado, ainda que a ordem, compilação, e teologia que apresentou seja de alto valor. Afinal, não é possível realizar uma análise metódica, profunda e católica do conjunto das revelações privadas sem perscrutar o conjunto da ação do Espírito Santo na Igreja pelas profecias particulares, ainda que tenham sido descobertas recentemente.
Entretanto, um trabalho teológico sério sobre o futuro, além de exigir constante atualização, precisa ter um critério para a seleção e também supressão de profecias calcadas na harmonia do conjunto das profecias privadas, interpretações das profecias públicas em sintonia com o conjunto anterior, uma reunião prévia da doutrina católica acerca das revelações, hipóteses faltantes para dirimir assuntos que suscitaram dúvidas ao longo da compilação e, por fim, uma seleção do que é apoiado pela Tradição Católica, já que o Direito Canônico não obriga mais o Vaticano a analisar obras de tais gêneros, e se aprova tudo quando não escancaradamente contraria a fé. É evidente ainda que a metodologia científica da história exige sempre a indicação da bibliografia com fonte primária, quando não há a própria.
Pe. Benjamín Martín Sanchez diferencia "Fim dos tempos" e "Últimos Tempos"
Em artigo ao site americano Tradition in Action, Margaret C. Galitzin [3] expõe o livro do teólogo espanhol mostrando a crucial diferenciação de dois conceitos muitas vezes confundidos:
Fim dos tempos e Últimos Tempos.
"Na era que se seguirá, Pe. Sanchez observa: “Cristo reinará de um extremo ao outro do mundo, e todos os seus inimigos cairão aos seus pés (1 Cor XV) para dar a Ele sua vassalagem. Sua Igreja será gloriosamente triunfante em toda a terra [4].
O Fim dos Tempos ou o Julgamento Final ocorrerá somente após esse período do triunfo de Deus na terra. O grande castigo e purificação do mundo não deve ser confundido com o Juízo Final, Pe. Sanchez enfatiza, pois as Escrituras nos dizem que nem mesmo os Anjos do Céu sabem o dia ou a hora deste último.
O que é anunciado nas Escrituras e profecias, que será apresentado nesta série de artigos, não é o fim do mundo, mas o que ele chama de Julgamento das Nações que ocorrerá durante um Grande Castigo que virá sobre um mundo que perdeu a Fé e transgrediu gravemente todas as leis de Deus. É um castigo que ocorrerá em nossos tempos preditos pelas Escrituras e descrito mais claramente em várias profecias aprovadas."
Depois explana uma interpretação sobre um trechos sagrados de São Lucas XXI: "Ai das mulheres que, naqueles dias, estiverem grávidas ou amamentando! Porque haverá grande angústia na terra e grande ira contra o povo. Cairão a fio de espada e serão levados cativos para todas as nações, e Jerusalém será pisada pelos pagãos, até se completarem os tempos das nações [Da Vulgata: Væ autem prægnantibus et nutrientibus in illis diebus ! erit enim pressura magna super terram, et ira populo huic. Et cadent in ore gladii, et captivi ducentur in omnes gentes, et Jerusalem calcabitur a gentibus, donec impleantur tempora nationum]”
"O que significa a expressão "tempos das nações?" Padre Sánchez explicou: "Sem dúvida, as palavras de Jesus Cristo referem-se às do Profeta Ezequiel: "Uivai, ai, ai do dia: Porque o dia está próximo, o dia do Senhor está próximo: um dia nublado, ele será o tempo das nações (Ez XXX, 2-3)".
E continua o teólogo: "Certamente, eles significam o início de uma nova era que será caracterizada por uma falta de fé no mundo ou uma separação, um afastamento dos homens de Deus. O estudioso das Escrituras Fillion comenta isso também: 'É a hora no qual Deus se proporá a desabafar Sua ira contra o mundo paganizado.'" [5].
Outra profecia sobre a conversão de Israel está na Epístola de São Paulo aos Romanos XI: “Pois não quero que ignoreis, irmãos, este mistério (para que não sejais sábios em vossos próprios conceitos), aquela cegueira em parte aconteceu em Israel, até que entre a plenitude dos Gentios. E assim todo o Israel deve ser salvo, como está escrito ..." [6].
Qual o significado da frase "até que entre a plenitude dos Gentios?" Pe. Sánchez deduziu que a frase é equivalente à "quando a fé chegar à sua plenitude," isto é, quando todos os Gentios a quem Deus determinou chamar "formarão um povo fiel consagrado ao seu nome" (Atos XV, 14) [7] este seria um tempo após o grande castigo quando todas as nações irão retornar para a fé e estabelecer uma nova Cristandade antes do fim do mundo" [8].
Desmond Birch após a análise de inúmeras profecias: virá um castigo menor precedendo uma Era de paz (a qual não será de mil anos). Então, virá o Anticristo
Embora não pareça que tenha definido conceitos como o "fim dos tempos" e "últimos tempos" em seu extenso livro, assim como esta parte do volume I até esta edição, Desmond Birch separa claramente os tempos futuros [9].
Suas investigações, desde as profecias privadas até as públicas, passando por diversos exegetas, incluindo hipóteses para juntar logicamente uns eventos a outros, chega a uma conclusão notável: virá um castigo menor, depois uma Era de paz e, por fim, um castigo maior no tempo do Anticristo.
A proximidade das conclusões de Birch com as alcançadas nesta parte do volume I, apesar de Birch rejeitar o tradicionalismo (talvez porque tenha tido contato somente com uma caricatura deste) pode ser atribuído à sua fidelidade ao requisito para um trabalho sério no tema, conforme delineado no início deste artigo.
Além disso, conhecendo bem o catecismo da Igreja Católica sobre escatologia, Birch rejeita o milenarismo, ou uma data de mil anos, só presente na cabeça de indivíduos que no fundo se agradam com este mundo, por isso, deformam qualquer defesa de uma Era católica vindoura. Tais personagens se apoiam em uma afinidade por esta sociedade inteiramente dominada pela Revolução, onde o livro do Mons. Delassus, "A Conjuração Anticristã - O Templo Maçônico que quer erguer sob as ruínas da Igreja Católica", é um vaticínio cumprido. Na época do lançamento de sua obra, Birch tinha este espírito, pois afirmava ser o castigo menor algo condicional.
Ora, não parece que o católico hoje é obrigado a crer em Reino de Maria ou Era de paz, ainda que tais conceitos, pela boca de quem o defende, esteja desprovido de qualquer relação com um milênio. Entretanto, não parece católico dizer que o mundo atual, com seus milhões de abortos anuais (para abreviar a lista de abominações desta sociedade globalizada) passará sem castigo em um futuro próximo, assim como não era católico dizer que Sodoma e Gomorra, no tempo de Lot, passaria sem castigo por tudo que se realizava.
Por isso, o autor americano, após a análise exaustiva de inúmeras profecias (ainda que muitas vezes sem uma fonte duvidosa e não primária) está mais próximo da verdade do que os cegos para qualquer intervenção Divina próxima.
Padre admirado por S. Teresinha, citando a outros exegetas famosos da Escritura, diz que o fim do mundo será precedido por uma total catolização do mundo
"Cornélio a Lapide [N.E: padre jesuíta do século XVI/XVII], o mais sábio dos intérpretes dos livros santos, expressa a sensação de que o fim dos tempos não virá antes que o cristianismo tenha sido não somente divulgado, propagado, mas que ele tenha sido estabelecido, organizado, e subsistido no estado de instituição pública entre os homens de todas as raças e todas nacionalidades, de tal forma que antes do curso dos séculos ter terminado, não haverá uma praia bárbara [N.E: plage barbare], nenhuma ilha perdida no Oceano, nenhum lugar atualmente desconhecido nos dois hemisférios, onde o Evangelho não tenha brilhado em todo seu esplendor, onde a Igreja não tenha se manifestado com sua legislação, suas solenidades, sua hierarquia contida nos bispos e pastores da segunda ordem, onde, enfim, não seja plenamente verificada a profecia: "não haverá senão um rebanho e um só pator" (Cornél. à Lapide, Comment. in Mt., vol. xv, p. 564).
Opinamos por este último sentimento. É mais conforme ao testemunho das Santas Escrituras. É mais de acordo com a sabedoria e a misericórdia de Deus, que não distingue entre civilizações e bárbaros, entre gregos e judeus, mas que, desejando a salvação de todos os homens, não exclui nenhum da luz e generosidade da Providência, que toma uma idêntica solicitude para com todos os povos e os chama sucessivamente ao conhecimento de Sua lei, nos tempos fixados por seus imutáveis decretos.
Ora, é suficiente lançar os olhos sobre uma mapa geográfico para reconhecer que a lei evangélica está longe de ter sido promulgada a todos os povos, e que inúmeras multidões, no tempo presente, residem ainda sob as trevas, e não possuem o menor matiz das verdades reveladas" [10].
Conclusão
Temos exposto que este trabalho não se debruça sobre o fim dos tempos, como e quando virá o Anticristo, bem como os sinais precedentes de sua vinda, mas desembaçar o tempo mais próximo deste mundo, ou seja, o fim da sociedade revolucionária e anticristã, o fim da crise na Igreja, e o fim da política guiada pelas trevas. Depois destes fins não virá um "milênio", e sim o que se chamou, com S. Luís Grignion, de "Reino de Maria", justo o contrário do mundo atual em seus aspectos revolucionários e anticristãos. Apenas com o fim deste Reino de Maria, onde Nossa Senhora será Soberana dos corações, virá o Anticristo.
Em conclusão, tratamos realmente dos "últimos tempos", conforme o mesmo S. Luís Grignion menciona em harmonia com a posterior mensagem de La Salette, compilada no capítulo V. Já a conversão dos judeus, a ocorrer por obra de S. Elias no fim do mundo, não se torna impossível por nenhuma Era católica anterior, pois os judeus podem apostatar por obra do Anticristo, ou o povo que então habitará a terra santa será apóstata, ou algo encaixando nesse simbolismo, mas fora do entendimento e escopo deste trabalho. Portanto, todos os autores expostos aqui só corroboram as teses gerais desta parte do volume I.
Próximo capítulo: Sociologia Católica Tradicional VS falsas teorias sociológicas: QAnon, Globalismo, Colapsologia, NOM, etc. Peste na Teologia da história
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Doutrina Católica sobre o milenarismo (crasso, mitigado, etc). Nossa posição
Diferença
entre teologia da história, hipótese teológica, e interpretação das
Sagradas Escrituras. Nível de adesão católica a cada uma
Sobre a influência de fatores sociais e psicológicos em interpretações sobre o futuro e profecias. Estamos isentos disso?
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[1] Travamos contato por meio do site americano Tradition in Action
[2] Retirado de: http://eschatologie.free.fr/bibliotheque/abbe_charles_arminjon/fin_du_monde_present_et_mysteres_de_la_vie_future.html
[3] Tradução do Tradition in Action do Brasil: https://traditioninactiondobrasil.org/religious/075-Judg-1.htm
[4] Rev. Benjamín Martin Sánchez, The Last Times: Public and Private Prophecies, English Trans. by André Marie Bonzaález, TOP, 1st ed., Imprimatur: Bishop Eduardus Zamorensis, 1968, p. 9.
[5] Ibid.. The Last Days and the Fall of the Antichrist, pp. 493-494
[6] Ibid., pp. pp. 494-495
[7] Ibid., pp. 495-496
[8] Tradução do Tradition in Action do Brasil: https://traditioninactiondobrasil.org/religious/094-Judg-2.htm
[9] Conforme parte de sua obra, junto ao sumário, disponível no link: https://archive.org/details/chapter8_202003/page/n101/mode/2up. Além das séries da EWTN "The Last Things in Time and Eternity", por Desmond Birch e Colin Donovan: https://www.youtube.com/watch?v=i44h-6tH7KI&list=PLnlOn-PNk1_VRySPzImhRdwiDvsGcWXI6&index=11
[10] Abbé Charles Arminjon, Fin du monde présent et mystères de la vie future, 1881, primeira Conferência. Link: http://eschatologie.free.fr/bibliotheque/abbe_charles_arminjon/fin_du_monde_present_et_mysteres_de_la_vie_future.html